Tuesday, March 27, 2007

Lausanne, a olímpica


Estes telhados lembram-me Lisboa. Mas não é. De fundo, as águas poderiam ser do Tejo. Mas não são. O recorte da costa poderia ser da marginal. Mas não é. Mais distante há um repuxo de água. Mas não o de Paço d’Arcos. Nas ruas, nas lojas, nos cafés, nos restaurantes, nos supermercados, nos hotéis ouve-se falar português. Mas não estamos em Portugal. Quer dizer, Portugal é que lá está! Estamos efectivamente lá.
Lausanne. Leman. Genéve. Suiça! É esta a chave.
Lausanne é discreta, cosmopolita e elegante. Rivaliza em charme com as suas vizinhas Montreaux e Vevey. Os hotéis à beira lago transbordam luxúria e exuberância. As flores nos beirais animam e embelezam as janelas, que adornadas e coloridas dão os bons dias às manhãs. No lago corre apressado o ferry com destino a Evian, França. Rasga as águas do Leman vezes sem conta.
Na beira lago passeia-se aprazivelmente. Multiplicam-se os espaços públicos, as sombras e zonas de estar. É aqui que fica também o conhecido museu olímpico. Merecidamente reconhece os feitos dos atletas que se batem nas mais importantes e prestigiadas manifestações desportivas do mundo. Os portugueses também lá figuram, sendo possível encontrar facilmente referências aos incontornáveis da maratona: Carlos Lopes e Rosa Mota.
Lausanne tem várias cidades dentro da cidade. Na medida que se deixa Ouchy e o lago, ao subir acentuadamente, chega-se à “cidade média”, centralizada na estação dos caminhos-de-ferro. Daqui parte-se para a “cidade alta”, velha e acidentada. As ruas até agora largas, estreitam-se, as avenidas deixam de ter direcções definidas, os percursos intercalam-se com escadarias e desníveis. Encontramos os principais atractivos da cidade em termos patrimoniais. As igrejas com destaque para a grande catedral, vistosa e deslumbrante, altiva e arrojada, marcam todo este território. É a cereja sobre o bolo. Da Catedral goza-se uma vista abismal sobre toda a cidade e áreas envolventes. Os vermelhos dos telhados, as águas furtadas, as flores nas janelas, lembra-me Lisboa. Falta o cheiro das sardinhas, das castanhas do mar…

Próxima paragem…

Friday, March 16, 2007

Às voltas por Idanha


Nas voltas das Beiras, a cada virar de esquina tropeçamos em aldeias recônditas, mais ou menos isoladas, em vales encaixados, no topo de colinas, onde quer que estejam dão graça ao caminho. Faço desvios de quilómetros, paragens sucessivas, incursões menos prováveis, na minha câmara fotográfica registo tudo, como dizia o slogan “…para mais tarde recordar…”.
Mergulho na rota das aldeias históricas e patrimoniais. Surpreendo-me. Muito. Idanha-a-Velha promete oito séculos de História e histórias. Lá longe, no seu terreiro de festa, está altiva a Senhora do Almortão, a tal que virou costas a Castela. Sem ser na altura das festas, está só, num descanso apenas interrompido esporadicamente pelas excursões que tem paragem obrigatória nestas bandas.
Dirijo-me para a vila. Meto-me por ruas esguias, apertadas. Das janelas as velhas gritam-me: “- não tem saída senhor! Volte para trás!” E é isso que acontece, por duas ou três vezes ando como os caranguejos, para trás. Tomo a decisão mais apertada. Encostar o carro e percorrer tudo, mas mesmo tudo a pé.
Não há rua que não queira palmilhar, não há miradouro que não queira observar para contemplar em redor, até que a minha vista tudo alcance e se perca, não há escadaria, por maior e tortuosa que seja que não queira subir.
Nas muralhas caídas, corro, salto, desvio-me das pedras à procura dos melhores ângulos. A vista sobre a vila, ali mesmo ao lado, coloca-nos num patamar altaneiro. Vejo a igreja, os telhados entrelaçados que parecem tecer padrões de cores e formas, combinadas metodologicamente, colorindo o céu azul que sobre eles se eleva. Vejo os muros que rasgam as artérias e separam a vila altaneira dos taludes que mergulham abruptos, encosta abaixo até encontrarem a água que corre nos meses chuvosos de Inverno.
Gosto de pormenores, de janelas, de portas, de cantarias, de telhados, de chaminés, de pessoas, de muros, de chãos... Registo-os. No pormenor da foto que vos deixo, na simplicidade das voltas e mais voltas que caracterizam as Beiras, sobressai um ramo, apontamento de bom gosto, igualmente simples. Gosto disso, nas viagens e nas pessoas. Por mais voltas que se dê, por muito que se percorra, mesmo quando parece existir um labirinto sem fim, há sempre algo bom que emana do branco e do vazio. São os tais pormenores que fazem (sempre) a diferença e fazem com que a conquista e o atingir de um objectivo tenha um gosto tão especial.

Próxima paragem…

Thursday, March 01, 2007

Pax Julia


Tranquilamente caminho pela rua estreita que me leva do convento de São Francisco à praça da República onde se encontra a impressionante igreja da Misericórdia, nitidamente de influência italiana, nomeadamente na entrada que lembra o Mercato de Loggia em Florença, mas sem as esculturas que caracterizam a segunda.
Entro no ritmo destas paragens. Devagar, devagarinho, quase parado. A calma (calor) toma conta do corpo e não permite grandes acelerações. Na torreira do Sol, quase frito nos quase 40 º C que se fazem sentir. Daí ao castelo, é um pulinho. Entro. Surpreendo-me com o excelente estado de conservação, com a informação disponibilizada e com a simpatia de quem nos recebe. “Estamos quase a fechar…” – dizem-me – “mas dê lá a sua voltinha descansado! Não deixe de subir à torre de menagem, a vista é magnífica!”
Subo. O calor e a sede fazem com que a subida pareça interminável… mas vale a pena. Os olhos alcançam toda a Pax Júlia, alva de cal, rodeada da planície retalhada e multicolor. Nesta altura os verdes secam e dominam os tons pastel. Uma aguarela.
Capital da planície, Beja descansa serena à sobra de um chaparro. O final da tarde ameniza a temperatura. Percorro agora a rua do comércio, ainda sem a invasão das lojas “franchisadas”. Aqui e ali, começam a surgir, sorrateiras, as osgas nas paredes. São muitas, verdadeiras artistas ao desafiar a lei da gravidade. Acho-lhes piada. Mas acho mais piada a quem se desvia delas com medo que lhes caiam em cima …
Na manhã seguinte, no exterior das muralhas do castelo visito o mercado matinal de sábado. Gosto de percorrer mercados, de falar com as pessoas. Neste caso era necessário entrevistá-las, corria a elaboração do Plano de Desenvolvimento Turístico do Alentejo. Era preciso ouvir opiniões, avaliar produtos, desenvolver outros, propor novos. Observo um estrangeiro. Dirijo-me a ele e avanço com a entrevista. Era alemão, 50 e tal anos, viajava com a esposa e estavam a apreciar bastante as paisagens alentejanas e a gastronomia (um clássico!). Para completar o perfil perguntei-lhe acerca da sua profissão. Responde-me – “Sou pintor…” sem o deixar terminar e entusiasmado com a originalidade da profissão, que na altura considerei um achado entre as dezenas de pessoas com quem já tinha falado, não perdi a oportunidade e questionei se não havia encontrado boas fontes de inspiração para pintar no Alentejo, ou mesmo, para pintar o Alentejo. A resposta não tardou. No meio de uma gargalhada disse-me: - “sou efectivamente pintor, mas de construção civil!” – a entrevista terminou numa risada completa.

Próxima paragem…