Wednesday, January 31, 2007

Barrocal


As flores das amendoeiras brotaram novamente e mais uma vez envolvem-me no percurso casa trabalho. Gosto desta altura do ano. Da candura, da pureza e marca forte e intensa que caracteriza a paisagem algarvia. Parece que o Algarve é mais Algarve, se é que me faço entender. Em puto corri pelos amendoais, brincava pendurado nas figueiras que ficavam em redor do colégio do Alto. Nessa altura o barrocal invadia a cidade. Ali bem perto ficava uma quinta que ano após ano recebia todos os miúdos das escolas de Faro. Brincávamos e alimentávamos os animais, colhíamos frutos e legumes, andávamos de tractor, de carroça e éramos felizes! Formatavam-nos valores, dos bons, acho! Hoje sou feliz, também pelo que fiz enquanto miúdo. No ensino primário sempre me enalteceram as marcas e a identidade regional. Nunca a perdi. Carrego-a comigo. É quase genético. Não sou bairrista mas gosto MUITO do Algarve e de ser algarvio.
Dos primeiros ensinamentos, entre o Litoral e a Serra, o Barrocal. Por vezes vê-se o mar.
O sequeiro domina a paisagem. As hortas, os animais, o campo, as aldeias, as vilas e as gentes.
Alfarrobeiras crescem quase espontaneamente, intercaladas por estevas e palmeiras anãs. Outrora ração para bestas, a alfarroba é desde alguns anos, matéria-prima de eleição para doçaria e licores. Cada vez mais os “doces tesouros” algarvios juntaram à amêndoa, ao figo, ao milho e à laranja o delgado fruto. Tortas, tartes, bolos, bolachas, doces, geleias, licores, aguardentes, fazem parte do rol de especialidades, em que a minha preferida é a mousse de alfarroba, que ao contrário das outras, não é assim tão fácil de encontrar…
A seu tempo também as folhas recortadas das figueiras esconderão os figos. E como gosto de figos! Doces, dourados e amadurecidos pelo sol, de capa rasgada, como se a revelar o caminho para o pecado.
Ainda é Inverno, no chão as folhas amarelecidas aguardam a companhia dos frutos, das cascas e das flores. Gosto das tonalidades que preenchem o solo, do som que fazem ao ser pisadas, do cheiro forte quando molhadas pela chuva. É o Barrocal. É o Barrocal. Por vezes vê-se o mar.

Próxima paragem…

Thursday, January 18, 2007

Tamerza, dorso de mulher


No final da segunda grande guerra mundial foi abatido um avião britânico, despenhando-se em pleno deserto. Do brutal acidente aéreo resultou um ferido grave. Queimaduras de último grau povoavam todo o corpo do inglês, cujo nome se desconhecia (Ralph Fiennes). Juliette Binoche, ou melhor Hana, dedicada e terna enfermeira canadiana, trata-o e nasce entre eles uma intensa relação de amizade e confidência. Durante a convalescença são obrigados a recolher-se numa gruta. A gruta do mergulhador, assim denominada graças às pinturas que ilustram a sua galeria. É assim, telegraficamente, a história do “Paciente Inglês”, o premiado filme de Anthony Minghella, que arrecadou 9 Óscares em 1997, baseado na obra de Michael Ondaatje.
Grande parte da acção foi rodada na Tunísia. A gruta existe e rasga a enorme garganta de Tamerza. Embora sem mergulhadores, é realmente bela, e nas suas formas arredondadas e perfeitas, há quem identifique o dorso de uma mulher.
Este local já era um ponto obrigatório de visita pela sua grandiosidade cénica, contudo, desde a rodagem do filme, ganhou outra dimensão. São inúmeros os visitantes que querem espreitar e percorrer as pisadas do “Paciente Inglês” por terras tunisinas. Fruto desta procura, realiza-se em redor desta atracção, um mercado onde se podem encontrar desde rosas do deserto, a coloridas túnicas, perfumes ou mesmo animais de estimação tão curiosos como corujas, variados insectos ou répteis característicos e endógenos do Sahara. Fico-me pelas rosas do deserto.
O “Paciente Inglês” não foi uma estreia para a Tunísia nas lides cinematográficas. Antes pelo contrário. Pelas areias e dunas do deserto, pelas magníficas paisagens lunares ou pelos refrescantes oásis, foram já rodados filmes como a “Guerra das Estrelas”, “Indiana Jones” ou “Lawrence da Arábia”. Sem dúvida um historial impressionante.
Rever cada um destes filmes e vislumbrar locais visitados é delicioso. Por momentos sou parte deles, lamentando apenas que as câmaras não acompanhem o sentido e direcção da minha memória visual. Contudo, quando os revejo, fico em vão, nessa expectativa.

Próxima paragem…

Thursday, January 11, 2007

Um!


Há precisamente um ano iniciei a minha viagem.
Partilhei múltiplas sensações.
Calor, frio, chuva, vento, mantos de neve, desertos, prados, mar calmo, mar agitado, águas quentes, frescas, transparentes, rios, ribeiras, grandes planícies, planaltos, montanhas, serras, cidades cosmopolitas, cidades históricas, românticas, agitadas, vilas medievais, termais, aldeias escondidas, ruas estreitas, vielas, grandes avenidas, pontes, monumentos, praças, museus, caminhadas, levadas, percursos, trilhos, roteiros, sabores diversos, pecados, doces, salgados, alcoólicos, cores fortes, vivas, cinzentas…
Foram muitos os destinos. 16 países e um sem número de paragens. Em cada uma delas viajei novamente. Como se lá estivesse. Na verdade, penso que estou um pouco por todos os sítios onde estive, pois eu tenho-os sempre comigo.
Viajo. Viajo muito. São cliks! Tão depressa contemplo o Monte Branco, como percorro as Ramblas, mergulho na Boavista, corro no Sahara, vagueio por Alfama ou atravesso a Ponte Vechio. Tão depressa saboreio um gauffre em Bruxelas, como degusto um chá de menta com pinhões em Matmata, uma Guiness em Temple Bar, moreia frita em Sines ou uma água de coco em Ipanema. Tão depressa assisto a um concerto num refundido bar no Soho, como vejo um espectáculo do Black Theater em Praga, assisto a uma ópera em Bratislava ou participo no ensaio da Beija-flor no Rio de Janeiro!
Memórias. Muitas! Percorri muitos e muitos quilómetros e até tive direito a um programa de rádio. Foi estranho ouvir-me na voz do João Vaz da Rádio Comercial, mas ao mesmo tempo gratificante.
Vou continuar. Gosto de viajar, relatar aqui as minhas voltinhas, permite-me fazê-lo mais vezes.
Muito obrigado a todos os meus amigos, visitantes e leitores pelo facto de viajarem comigo. Prometo novas paragens, continuando a abrir as portas do meu Mundo.

Próxima paragem…

Friday, January 05, 2007

Tempo de vindimas


As badaladas, a fina areia que desliza na ampulheta, o tremelicar dos ponteiros dos relógios que arrastam certeiramente o tempo. Todos juntos parecem alinhar-se de forma ordeira, qual parada militar onde não há passos errados. Dão-nos as horas.
Ali bem perto, lá no alto e com uma vista soberba para o Leman, cruzo-me com placas que indicam distâncias para paragens longínquas, algumas já conhecidas. Os mantos verdes servem de cama e repasto às cabras e veados que passeiam livremente. Curiosos intrometem-se com os visitantes, que afinal foram lá para brincar e correr com eles. Nas encostas, os fartos cachos de uvas amadurecidos pelo sol, reflectem a sombra de quem os colhe, e bebem a brisa que se espalha e sobe rumo ao Pont d’Oúchy.
É altura das vindimas. Vinha abaixo, vinha acima, alguns persistem na apanha manual do apreciado fruto e na sua transformação no sangrento e aveludado líquido, o tinto. Os suíços não são pródigos na sua produção, mas não deixa de ser fenomenal, como um país que lidera indicadores económicos da maior importância, não despreza nem dispensa a actividade agrícola só por si. Não só a vinha ocupa as margens do lago. Na verdade estas encontram-se totalmente cultivadas, sobretudo com legumes. Na aposta no sector agrícola se fomentam os restantes sectores. Um país não deixa de ser desenvolvido e altamente tercearizado por apostar também neste sector. Nós por cá temos vistas curtas e abdicamos da nossa sustentabilidade a troco de investimentos, muitas vezes furados e nocivos para o ambiente e economia nacionais. Temos grande potencial climatérico, temos Know how!... falta-nos vontade política e iniciativa empresarial. A agricultura não é sector menor, antes pelo contrário!

Acabado 2006. Desejos de muita saúde, paz, amor e viagens!
6, 5, 4, 3, 2, 1…Feliz Ano Novo 2007!!!!!!!

Próxima paragem…