Wednesday, February 14, 2007

É cultural!


O Leste europeu surpreende a cada passo.
A imponência, o brilhantismo, a elegância, o classicismo. O culto da cultura. Sente-se. Sente-se em todo o lado. Nas pessoas felizes, bem formadas, correctas. Nos edifícios bonitos, ornamentados, cuidadosamente conservados. Nas programações culturais, ricas, permanentes, diversificadas, intemporais, mais ou menos arrojadas. Cultivam-se os clássicos, dando-lhes novas roupagens, novas interpretações, novas leituras, impostas e desejadas pelas novas gerações, também elas ávidas de cultura. É cultural. Está-lhes enraizado. O culto pelo bom, pelo belo.
Hoje há ópera em Bratislava! O edifício engalanado prepara-se para mais uma noite gloriosa de espectáculo. Hoje, brilha mais que os seus pares que o rodeiam. Sim, ao lado fica o espectacular edifício do teatro e a casa de música. Todos contemporâneos, testemunho da prosperidade imperial da simpática cidade eslovaca. É a cultura.
Hoje há ópera em Bratislava! A azáfama esmorece com o anoitecer. Os camiões finalmente descarregaram os últimos adereços para a peça. Ultimam-se os preparativos, gelam-se as garrafas de champagne. Está tudo a postos.
Mesmo ao lado, o MacDonalds enche-se de burburinho e confusão. Ao contrário doutros tempos, é aqui, que agora se petisca antes da grande noite na ópera. As peles e gabardinas enchem por completo o restaurante. A globalização no seu melhor. Também os velhos e oprimidos do centro e leste europeu se renderam às tentações do Capitalismo. Champagne? Claro! Mas no intervalo da Ópera. Antes, o que vai mesmo é um Big Mac, batatas fritas e uma Coca-cola…das grandes! Afinal também é vermelha, as afinidades não serão assim tão poucas.
Aumenta o burburinho, aproxima-se a hora do espectáculo. Atravesso a rua, observo os cumprimentos e saudações. Curioso como se transformam com o ambiente. Nem parecem os mesmos que minutos antes se lambuzavam entre mostarda, maionese e ketchup. É cultural.
Tomo o meu lugar. A sala, lindíssima, está cheia. Sobe o pano. Um clássico, Don Giovanni.
Pela primeira vez, no final do espectáculo não me dói a cabeça. Passo a explicar. Aqui, os casacos de peles não cheiram a naftalina, a mofo e a velho. Saem muitas vezes do armário, faz realmente frio e é cultural. Em Lisboa ou em Faro, não. Saem lá de vez em quando para arejar, durante as três horas do espectáculo e voltam a ser encafuados durante anos, até ao próximo evento, é social! Tchim tchim!!!

Próxima paragem…

Thursday, February 08, 2007

Mérida, a romana


Foi fortíssima a presença de inúmeros povos por terras ibéricas. Os vestígios encontram-se a cada passo. Espanha foi particularmente bafejada pelas heranças deixadas por estes. Ao mesmo tempo tem realizado um trabalho evidente ao nível da conservação, perpetuando-as até aos nossos dias, carregadas de histórias, memórias e vivências.
Mérida constitui um excelente exemplo, testemunho de uma gloriosa e próspera marca romana, definida num conjunto de grandiosas edificações.
A máxima “pão e circo” encontra-se aqui bem reflectida. Além dos espaços de trabalho, fruto da prosperidade económica do império, nomeadamente os tanques de salga e as vias e pontes que circundam a cidade, encontramos espectaculares locais de lazer. Teatro, anfiteatro, circo, saunas e jardins. Os primeiros fascinaram-me pela imponência majestosa, pelo enquadramento cénico, pelo ambiente misterioso. Hoje em dia estes espaços acolhem festivais de artes performativas, dança, teatro, novo circo e concertos. A cada festividade revive-se os tempos de outrora, é o apogeu numa das grandes cidades do império romano. Adivinham-se movimentadas correrias, carros que se cruzam, gente apressada, cândidas túnicas, perfumes doutras paragens, repastos de fazer inveja aos deuses! Tudo isto é mais ou menos verdade, mas as vias são outras, os transportes também. Mantém-se porventura, as roupas aprumadas, os perfumes seleccionados e os menus requintados.
Valoriza-se o património, enriquecem-se as pessoas, estimula-se a fruição dos espaços, a sua conservação, fomenta-se a cidadania. A forma como se lida com o património diz muito da identidade de um povo. Neste aspecto, os espanhóis dão cartas, valorizando-se exacerbadamente, por vezes até demais. Temos algo a aprender.

Próxima paragem…