Tuesday, March 18, 2008

Mazca


Escondida, quase oculta nos fundos vales, a pitoresca Mazca marca o quadrante Noroeste de Tenerife. Aqui, a ilha é verdejante e contrasta com a aridez do Sul e a exuberância negra vulcânica do Teide. Até há cerca de quarenta anos, a povoação esteve isolada, situação redundante num contexto insular. As vias, estradas, a electricidade e a água da rede pública chegaram tardiamente, penalizando as gentes da já geograficamente penalizada localidade. Longas caminhadas distavam dali à povoação civilizada mais próxima, a subir, a subir, a subir…. A remota Mazca vale pela localização ímpar que a dota de uma paisagem singular, perfeitamente enquadrada num contexto forte, agreste e marcante. Vales frondosos, montanhas recortadas, caminhos tortuosos e no fim um mar imenso.
O mar não está longe, mas o acesso está dificultado. As assombrosas arribas cinza que determinam o extremo da ilha mereceram o nome de Los Gigantes. Não é para menos, 200 metros de altitude marcam e impõem a sumptuosidade cénica destes gigantes sobre as águas do Atlântico. Do mar sombreado pelos pequenos “Adamastores”, os 200 metros parecem 2000, crescendo e rasgando o céu, pontuado pelos voos velozes dos albatrozes, guardiães dos Gigantes e companheiros de infortúnio da população isolada de Mazca, que certamente gostaria de ter asas e poder também voar.

Próxima paragem…

Tuesday, February 19, 2008

Fantasia


Parece irreal, uma cidade para brincar. Mas mesmo numa brincadeira, dificilmente se juntariam tantos brinquedos e tão bonitos. Castelos, palácios, igrejas, pontes, estátuas, museus, tudo concentrado e multiplicado várias vezes. Não tenho adjectivos suficientemente fidedignos que a descrevam, certamente ficariam aquém do que Praga é e significa.
A capital da Boémia é encantadora, mágica, cenário perfeito para um espectáculo de marionetas, que aliás, são coisas que não faltam nesta cidade. São inúmeras as lojas que as exibem nas portas, nas janelas, em mostruários com um colorido múltiplo que domina o olhar e nos transporta para fantasiosas historietas. Não resisti e assisti a um espectáculo de marionetas, a ópera D. Giovanni de Mozart, só por si, um ex-libris da cidade.
A oferta cultural é imensa, diversificada e acessível. Para cada dia que lá estive arranjei um programa diferenciado. Fiquei fã do Teatro Negro de Praga, gostei do conceito – um cenário negro, onde jogam efeitos luminosos e materiais coloridos, aliados a performances artísticas, dignas de ginastas de alta competição e uma pitada de humor. A companhia apresenta em simultâneo vários espectáculos, repartidos por salas com pouca capacidade, entre 50 e 150 lugares, muitas delas, dentro de centros comerciais, passando quase despercebidas. Assisti às peças “Fausto”, “Alice no País das Maravilhas” e “As Viagens de Gulliver”, curiosamente as duas últimas encontram-se em digressão europeia e vão passar pelo Porto. Em Praga, o problema é mesmo a falta de tempo para ver tanta coisa. Nas principais igrejas é-nos oferecido, diariamente e em vários horários, concertos de música clássica, executados por exímios músicos que tocam os mais notáveis hinos deste género. Há para todos os gostos e bolsos. Escolhi um programa dedicado ao tema Ave-maria, uma trilogia com as versões dos conceituados autores, Schubert, Bach e Puccini, porventura, as mais célebres.
Mas nem só os olhos e ouvidos se enchem e satisfazem neste fantasioso local. Jamais esquecerei o cheiro emanado do pequeno carro estacionado junto do relógio astronómico na praça da cidade velha – Starometské Námestí, onde se vende o mais surpreendente e saboroso bolo. Uma massa enrolada num espeto, mergulhada em açúcar e miolos de amêndoa, a torrar sobre brasas, toda a praça fica perfumada e ninguém fica indiferente a tamanha descoberta, simples e deliciosa.

Próxima paragem…

Monday, January 21, 2008

DOIS!


Alertaram-me para o facto deste blog ter completado dois anos de existência.
Simplesmente esqueci-me. Na verdade tenho andando um pouco fugidio e o blog fica para segundo plano. Penso sempre em viajar e sobre o que viajei. Penso mesmo que não haverá melhor investimento. Vivo intensamente uns dias e desfruto-os toda a vida!
Foi no passado dia 11 de Janeiro de 2006 que iniciei a viagem. Já cruzámos oceanos, rasgámos os céus, caminhámos sem fim, estivemos literalmente de “papo para o ar” ou assistimos a espectáculos juntos.
Novos destinos estão reservados, efectivamente ou no mais íntimo e profundo desejo. A adrenalina fervilha-me nas entranhas, sempre ansioso por partir, mas também por regressar.
Muito obrigado a todos os meus amigos, leitores e companheiros de viagem.
Apertem os cintos de segurança, endireitem as costas das cadeiras, pois prometo levá-los a novas paragens!

Próxima paragem…

Thursday, January 10, 2008

País das especiarias


Verdejante e luxuriante como nenhuma outra, incrustada de frescas cascatas, adornada de habitações coloridas e pessoas com sorrisos rasgados, Grenada é um pequeno país situado no Mar das Caraíbas. Esta pequena ilha integra as denominadas Antilhas e Grenadinas. Colónia francesa até meados do séc. XVIII, acabou por cair nas mãos dos ingleses em 1783 com a assinatura do Tratado de Versalles. A influência colonial de ambas as potências, ainda hoje se faz sentir na capital Saint George’s, nomeadamente no forte George, verdadeira esplanada para a agitação do porto e para o mar das Caraíbas, testemunho inigualável dos confrontos que marcaram a disputa pela possessão da ilha. A arquitectura, as cores, os gradeamentos e os balcões testemunham a presença demorada dos colonizadores.
Mas se algo caracteriza e identifica este país, sem dúvida que são as especiarias. Num território com pouco mais de 340 km2, concentra-se o maior produtor mundial de noz-moscada. A produção supera a da imensa Índia. Cravinho, canela, pimentas, açafrão, louro, outras especiarias, mas também cacau e bananas, encontram-se um pouco por toda a ilha. Curioso observá-las em estado puro, na natureza. Como não poderia deixar de ser, a economia nacional depende em grande parte deste legado, empregando parte da população. Também o turismo ganha expressão acentuada, nomeadamente com a inscrição do país na rota dos cruzeiros por estas paragens. A cada embarcação renova-se por umas horas a carga turística local. Começa o frenesim dos taxistas, dos vendedores de artesanatos, dos dealers e dos oportunistas que em nome das tradições ancestrais se passeiam adornados de frutos e especiarias na cabeça e no pescoço. Por um punhado de dólares permitem o registo fotográfico para a posteridade. Todos dão um colorido e um quadro cénico singular à ilha.
Este pequeno paraíso fervilha de odores e sabores. Experimentei um saborosíssimo Roti de galinha (espécie de massa de crepe, recheada com galinha e batatas cozidas), ícone da gastronomia local, que obviamente e fazendo jus ao país, se encontrava carregadíssimo de temperos fortes e intensos, nada que um par de cervejas, também locais, não ajudasse a “arrefecer”. Para rematar, coco fresquíssimo, comprado a um dos poucos vendedores que circulam na praia, calma, tranquila e de águas calientes.

Próxima paragem…

Friday, December 21, 2007

Em casa


Chegou provavelmente, a única altura do ano em que não me apetece andar por fora. O Natal!
A minha família é muito próxima e passamos esta época sempre juntos. Agora que me ponho a pensar, sempre a passei no Algarve, ora em Alcoutim, ora em Tavira, em Faro, Altura, Albufeira ou São Brás de Alportel. Contingências diversas, nomeadamente o alargamento da família, por casamentos ou nascimentos, mudam a localização dos festejos, no entanto, mantém-se um denominador comum, a família. Esta tem aumentado e cada vez mais a luz do Natal parece brilhar intensamente, carregada daquilo a que chamam o espírito natalício, que para mim, não é mais que a reunião familiar. Obviamente que com a chegada dos filhos, dos netos, dos sobrinhos, esta quadra ganha contornos diferentes e existe uma alegria, ainda mais esfuziante.
Felizmente, na minha família existem muitos Natais, sempre que nos juntamos, a festa é garantida. Existe o culto da mesa, as refeições são prolongadas, diversificadas, bem comidas, bem bebidas, acompanhadas de conversa e histórias, que a cada ano se reinventam, parecendo sempre novas. Contamo-las e ouvimo-las como se fosse a primeira vez. O entusiasmo é enorme, o rodopio nos tachos, na louça lavada, que prontamente voltará à mesa para mais uma rodada de qualquer coisa… mariscos, enchidos, queijos, bacalhau, cabrito, feijoada de litão, doces e bolos da época…todos numa sinfonia de sabores que apenas se encontram nesta quadra. Noutra altura não fazem sentido, não sabem ao mesmo.
É já com água na boca que vos deixo um desejo especial, votos de um feliz Natal e um ano de 2008 cheio de coisas boas, saúde, sorte, e já agora, viagens!

Próxima paragem…

Friday, December 07, 2007

Inverno em Cracóvia


O termómetro não passa dos 3 graus, nem mesmo quando o Sol parece querer vingar nas frias manhãs de Novembro. Nas margens do rio Vístula, o velho dragão, símbolo da cidade, hoje não conseguiria expelir mais do que uma tímida fumaça, não intimidaria ninguém e o castelo da cidade seria tomado! É o que faço. Subo a rampa ondulante que me conduz ao interior de um conto fantástico, de lendas e segredos, de mitos e heróicas histórias. Jardins cuidados, galerias, bibliotecas, museus, edifícios com cúpulas vistosas, igrejas ricas e serenas e muito, muito mais, enriquecem o interior do castelo.
Como em todas as histórias, também aqui existem vilões, amarguras e lamúrias, marcas de um passado recente, abrupto, vergonhoso e revoltante. No alto e imponente muro que ladeia a rampa, jazem eternamente os nomes daqueles que sucumbiram na segunda grande guerra mundial, acontecimento que a cidade testemunhou e viveu de forma muito intensa e sentida. Do outro lado do rio fica a famosa fábrica do senhor Schindler, o tal da “lista” que inspirou Spielberg na sua tocante película a preto e branco. O castelo de Cracóvia é o centro cultural por excelência da cidade mártir, que viu crescer o jovem Karol Wojtyjla, que se tornaria no Papa João Paulo II, mas está longe de ser o centro da cidade.
Cracóvia fervilha e vive esfusiante na Rynek Glówny, a Praça Central, uma das maiores praças medievais da Europa. Na igreja de Santa Maria onde o órgão ecoa as preces temerosas dos crentes, ou no altar do século XV, só por si, uma obra-prima gótica; nas megastores culturais, tipo Fnac, onde descubro cds da Mísia e das Divas of Fado (cuja maioria dos nomes desconheço!) e livros de Lobo Antunes e Saramago; no Mercado Central adornado com os brasões das principais cidades polacas, que acolhe lojas onde dominam as cores alaranjadas do âmbar, vendido a preços irrisórios, nas arcadas que recebem pintores e obras de várias correntes; na torre do século XIV, única testemunha do antigo edifício camarário; nos bares e cafés onde se bebe vodka gelada como quem bebe copos de água. Aqui encontra-se o verdadeiro espírito da cidade. Jamais esquecerei o sabor e o preço insignificante do pão com paprika, vendido a cada esquina.
Não se pode circular de automóvel dentro deste centro, os transportes públicos circundam-no, mesmo na margem do anel verde, nesta altura do ano, mais amarelado, verdadeiro pulmão no meio da azáfama. Não resisti e passeei a pé sobre as folhas secas. O frio é mais que muito, nem as vodkas me aquecem o suficiente para não desistir de vaguear pelas ruas de Cracóvia. Apanho um eléctrico e volto para o hotel, são muito parecidos com os de Lisboa. Aliás, os polacos são muito parecidos com os portugueses, parecem felizes mas existe sempre algo na memória… é o fado e a saudade, mas à polaca!
Cracóvia, seguramente para voltar.

Próxima paragem…

Monday, November 05, 2007

No Século XII


Ghent, cidade localizada a menos de uma hora de comboio da capital belga. A primeira imagem foi de um autêntico “mar de bicicletas” no parque frontal à estação ferroviária. A generalização deste modo de transporte justifica este “mar”, assim como a própria orografia da cidade que facilita o seu uso.
Porém nenhuma outra imagem é mais forte e singular do que a obtida no Graslei-Koornlei, um conjunto edificado medieval, onde se destaca o Spijker, um edifício datado do final do século XII onde se armazenavam e conservavam alimentos para os tempos de fome e miséria. Este conjunto, de uma beleza fenomenal, situa-se na margem do rio Leie. No centro, de forma sobranceira, o relógio da igreja domina todo o conjunto e dita as horas, marcando o passo na manhã, que embora de Verão, teima em esconder o Sol. Nem mesmo o imponente forte Gravensteen rodeado por canais ou o impressionante Meat Hall, ex espaço de talhantes, actualmente reconvertido em centro de exposições, que alberga hoje o principal ponto de venda de artesanato local, maioritariamente composto por peças em barro, cerâmica e bordados, lhe retiram protagonismo. É impossível competir com a elegância e sobriedade do Graslei-Koornlei, com os altos-relevos que adornam as ombreiras das portas, com os telhados geométricos. São apenas meia dúzia de casas, mas são únicas. Graslei significa o local onde se vendem legumes e Koornlei onde se guarda o trigo, esta classificação demonstra bem a importância deste local em termos mercantis, que fizeram de Ghent o mais importante e estratégico porto interior da Bélgica, responsável pelo armazenamento e abastecimento das principais cidades do país.
Não muito longe e com algum interesse, vale a pena visitar o Museu de Folclore. Este apresenta alguns elementos etnográficos e ícones da cultura popular belga, centrando-se a colecção nos trajes tradicionais, nos instrumentos e na tradição oral flamenga.

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